quinta-feira, 14 de abril de 2011

Das cartas que eu não enviei I

e nem terminei.


Eu não sei como começar a escrever isso aqui. Eu queria te enviar, mas não sei se vou ter a mesma coragem que tive de escrever ao terminar e perceber que é hora de apertar ‘send’. Eu só queria saber como você está. Está bem? Resolveu aqueles problemas de adolescente rebelde com seu pai? Tá morando sozinho, como eram os planos, afinal? Dirigindo? Continua se drogando? São perguntas que passam pela minha cabeça todos os dias, mesmo eu prometendo que não me preocuparia mais com você. Na teoria é bem mais fácil que na prática, ainda mais quando você fecha os olhos e seu subconsciente faz questão de mostrar o quanto você ainda sente falta


07/04/11 - 03:20 a.m.

terça-feira, 5 de abril de 2011

para si - para o mundo


Ela gira. E gira e gira e gira. E gira sem se mexer, rindo da vida, rindo das pessoas, rindo do mundo. Ela gosta muito de rir, ele percebeu isso. Admirava-a em silêncio, meneando a cabeça, em conflito – ela era linda demais e boba demais. Ricardo gostava de ter os pés no chão. Gostava do mundo que conheceu e que era cem por cento capaz de controlar. Mas quando estava com ela, o mundo girava. O mundo girava e ele percebia que gostava de girar junto do mundo, junto de Laura. No entanto era ela ali no meio, a cabeça inclinada para trás, de olhos fechados, a trança enraizada se desmanchando pelas costas, e ele ali na muretinha, uma garrafa de cerveja barata em uma das mãos e todas as dúvidas na outra. Ela era tão livre de tudo, tão livre de todos. Sua figura leve e fortemente agasalhada quase era capaz de flutuar – Laura não sentia medo. Viu-se preso, porque ali não eram ele e Laura, era ele e a mureta, e Laura para todos os outros substantivos concretos e abstratos. Então ela se virou e, através da visão desfocada pelos pensamentos, Ricardo viu que ela estava sorrindo para ele. Laura endireitou o corpo, caminhou até ele e esticou a mão direita. Ele a encarou por um momento, sorrindo enviesado, e colocou a cerveja sobre a mureta, segurando sua mão. Ela riu gostosamente, e ele a acompanhou sem saber o motivo. Sentia-se contagiado por aquele riso, e quando os dedos gelados dela tocaram sua mão quente, uma descarga elétrica passou de Laura para ele. Ela se abaixou e o puxou consigo, deitando-se no chão frio da varanda. Ele encostou sem querer em sua perna, mas Laura não parecia se importar: estava ocupada demais lhe mostrando uma estrela que jurava conhecer. Eles riram juntos, e Ricardo sentiu tudo girar. E girava e girava e girava. Girava sem se mexer. Esqueceu-se das regras, esqueceu-se do mundo. Ele girava sozinho, girava com Laura. Ela segurou sua mão enquanto observavam um céu escasso de estrelas e inventavam teorias. Eles eram bobos demais.