quarta-feira, 31 de agosto de 2011

forever young, I want to be forever young.

“Você sabe, é difícil ser gente grande” Eu dizia, sentada na cadeira de balanço, balançando com as pernas para frente e para trás. “A gente tem uma porção de obrigações.Contas pra pagar e coisas pra fazer. E não é tão simples quanto ir pra escola e tirar boas notas; não, ser gente grande faz a gente ter que trabalhar. E no trabalho a gente não pode falar alto com o chefe, porque quem recebe a gente quando isso acontece é a rua, não a sala da diretora chata.” 


Coloquei a mão no queixo, pensativa. Bufei um pouco, tirando uma mecha de cabelo que caiu no meu olho, tentando lembrar do que mais a mamãe tinha falado. 


“E quando a gente tem filho, tem mais a obrigação de cuidar do filho, porque o filho precisa da gente. E tem os bichinhos de estimação, que precisam tanto da gente quanto o filho. E filho e bicho de estimação fazem a gente gastar dinheiro, então a gente precisa mesmo trabalhar.” 


Agora eu puxei minhas pernas para cima da cadeira e estou me balançando com as costas. Ele não me responde, mas eu sei que está me olhando com aquela atenção que só ele sabe me dar. 


“Eu não sei o que é obrigação, mas a mamãe fala tanto disso que deve ser mais uma daquelas coisas chatas de gente grande. E tem também o coração. Dizem que quando a gente cresce, às vezes o coração dói. E vivem falando de coração partido na televisão e naqueles textos bonitos que eu leio quando a vovó deixa aqueles livros velhos em cima da cama de manhã. Eu não sei, mas o coração partir deve doer bastante, né? O meu nunca partiu, e eu decidi que nunca vai partir porque não gosto de sentir dor. E nem vou deixar o seu partir, apesar de não saber como um coração parte. Já perguntei como isso acontece. Vovó disse que eu vou descobrir quando virar gente grande.” 


Coloquei as pernas para fora da cadeira e sentei sobre minhas mãos. 


“Sabe, dá um pouco de medo isso. Imagina só, você está andando na rua e PUF! o seu coração se parte. Vovó riu quando eu contei isso pra ela. Não sei como ela pode rir de uma coisa assim, é horrível. Aí ela fez carinho na minha cabeça e foi fazer café. Aliás, café é outra coisa que gente grande gosta muito.” Levantei e fui até o berço, ficando na ponta dos pés e tentando enxergar os olhinhos do meu irmão, que ria e esticava os braços para mim. “Depois ela me disse que às vezes o coração parte porque a gente gosta muito de alguém, mas eu não acreditei porque eu gosto de uma porção de gente e meu coração parece inteiro. O seu também, né?” Perguntei, segurando a mãozinha do meu irmão enquanto ele balançava as perninhas e sorria aquele sorriso desdentado de neném. 


“Eu acho que é difícil ser gente grande. Às vezes eu vejo a mamãe chorando escondida. Ela não sabe que eu sei, então é melhor você não contar que eu te disse isso. Mas ela chora. E a vovó também chora. Elas não querem que a gente veja, porque a gente é pequeno e elas tem que parecer mais fortes que a gente. Mas eu sei que elas não são. Elas são fracas e às vezes parecem tão sozinhas, mesmo que a gente esteja com elas. Pelo menos a gente nunca vai ser sozinho, eu e você, né?” suspirei. Pensar como gente grande exigia muito mais do que minha cabecinha de oito anos conseguia suportar. “Eu não quero ser gente grande. Quero ser pequena pra sempre, eu e você.” Cruzei os braços na grade e apoiei minha cabeça neles, com um pouco de dificuldade por causa da altura. “Mas a mamãe disse que essa é a era da tecnologia. Eu não sei o que é essa tal de tecnologia, mas ela disse que isso vai ajudar muita gente a ficar mais inteligente e que todo mundo vai saber de tudo. Quem sabe eu não descubro como faz pra ser criança pra sempre?” Ele balançou os bracinhos pra mim, e pegou meu dedo. 


“Eu queria ser criança pra sempre. Coração de criança não parte, e a gente nunca se sente sozinho. E você, quer ser criança pra sempre?” Uma risada gostosa de neném, e eu sorri de volta. Então a mamãe chamou pra jantar. “A mamãe tá me chamando, mas eu já volto pra ficar com você, porque eu prometi que você nunca vai ficar sozinho. Eu também não vou deixar seu coração partir, tá bom? A gente vai ser criança pra sempre, como Peter Pan e Sininho. Você vai ver.”


Dei um beijinho desajeitado em sua mãozinha, a única parte do corpo dele que eu conseguiria alcançar, e corri para a sala. Quando voltei ele já estava dormindo, então eu não tinha mais ninguém para conversar sobre meus planos, mas decidi começar a colocá-los em prática. Joguei meu Lego no chão e acabei dormindo entre as peças. Eu estava decidida a não deixar nossos corações partirem.

sábado, 13 de agosto de 2011

until the very end.


Eu estava relutante em escrever esse texto. É difícil colocar em palavras coisas que nem as lágrimas descrevem. A verdade é que eu tinha medo que escrever sobre o que é Harry Potter na minha vida soasse como uma despedida. Mas não é uma despedida, nunca é uma despedida.

Eu queria que houvesse algo no mundo que explicasse o sentimento de voltar no tempo, porque é assim que eu me sinto sempre que eu pego um dos livros na mão, ou ouço aquela música de um dos filmes. Eu deixo de ser a Stephanie de dezenove anos, cheia de responsabilidades e fobias, e passo a ser a Teté. Só a Teté. A garotinha de oito ou nove anos assistindo à um mundo que ela já achava tão melhor que a vida que ela levava. Eu viro toda olhos felizes e sorrisos brilhantes, porque eu sabia que Harry não era só o Harry. Então eu também não era só a Teté. Eu não sou só a Stephanie. Eu sou algo mais, porque o Harry, o Ron e a Hermione me ensinaram que eu posso ser brilhante sendo eu.

Eu queria poder explicar por que o cheiro dos livros me transporta para o momento em que eu abri a caixa de presente de Natal e encontrei todos os quatro livros, na época, e o quanto abri-los, a partir daquele momento, se tornou um ritual quase sagrado. Durante toda minha vida eu vivi em Hogwarts. Durante toda a minha vida eu lutei ao lado do trio por um mundo melhor. Lutei pelo amor.

Eu queria, do fundo do coração, explicar por que cada morte do livro foi como uma perda pessoal pra mim. E eu queria que entendessem o significado de segurar  o sexto livro nas mãos quando minha avó me consolou durante uma madrugada inteira quando o Dumbledore morreu, e o significado de segurar o sétimo livro nas mãos como único consolo e fuga pela morte dela.

Eu queria que entendessem que cada lágrima pelo final oficial dessa jornada que durou mais de dez anos não é mais tanto por saber que não haverá um próximo livro para se esperar, ou por saber que nunca mais verei Daniel, Rupert e Emma atuando juntos como Harry, Ron e Hermione. É que hoje, quando eu me olho no espelho, eu não vejo mais uma garotinha. Hoje eu vejo aquela do começo, Stephanie, mil e uma responsabilidades e um peso do mundo nas costas.

Mas a garotinha ainda existe, e está estampada em cada sorriso, cada brilho no olhar, cada lágrima nostálgica e cada toque de dedos na capa já não tão nova dos livros. Porque, na verdade, a magia é eterna. Hogwarts sempre estará lá para me receber em casa.

Hoje eu pego esse trem e volto para a plataforma 9 ¾ com a sensação de missão cumprida. E o orgulho por ver essa série indescritível, que mudou tanto a minha vida de tantas maneiras diferentes, é maior do que qualquer tristeza que eu possa sentir. Porque, como diria o pequeno Harry de onze anos, e o meu eu de oito, eu não estou indo para casa. Não realmente.