quinta-feira, 17 de maio de 2012

Você tem fogo?


Você tem fogo? Tenho. Acende pra mim. Você tem certeza? Nunca te vi fumando. Tenho, acende logo. Não sei, não gosto dessa ideia de você e cigarros. Você não vai acender, então? Não. Ok, me dá o isqueiro aqui. Você sabe que o problema não é quem acende. Sei, o problema é quem fuma. Mas eu preciso disso. Por quê? Porque dói, e cigarro parece anestesiar tudo. Me dá essa vontade de fechar os olhos e simplesmente não pensar em nada além da fumaça saindo da boca. Porque me ajuda a fugir. Você sabe que não pode fugir pra sempre, né? Sei. Mas, por enquanto, só me empresta a droga do isqueiro.  

sexta-feira, 27 de abril de 2012

baby.


Há pelo menos dois anos eu tranquei meu coração – e eu sei o quanto isso soa piegas e clichê, mas esse é o tipo de detalhe que não tem relevância alguma. O caso é que, tendo trancado meu coração e jogado a chave fora, não sei como essa chave que você possui na sua voz e nas suas palavras foi capaz de destrancá-lo. Não sei nem se você sabe tudo que fez, mas fez mesmo assim. E foi entrando devagar, trazendo um pouquinho de você pra mim, levando um pouquinho de mim consigo, ocupando os cômodos e me enchendo de vida, fazendo casa no meu peito e lar nas minhas orações.

Eu quis todo esse tempo - que parece ter sido um segundo, ou o fragmento de algo que eu nunca tive, na verdade -, poder dividir com você tudo que eu nunca dividi com ninguém, e te entregar verdades minhas e destruir todas as mentiras. Quis que você enxergasse através do meu sorriso, e quis carregar o peso de ser você nas minhas próprias costas, porque você merecia sorrir. Eu queria que você fosse todas as minhas primeiras vezes e queria ser todas as suas segundas chances.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

a little bit of faith

"Não se sabe quem respondeu, mas existe uma belíssima alma trabalhando no arquivo morto dos correios americanos.Tenho certeza de que não foi dos correios daqui de Crossville.

Abbey, nossa cadelinha de 14 anos morreu no mês passado. No dia seguinte a seu falecimento, minha filha de 4 anos, Meredith, chorava e comentava sobre a saudade que sentia de Abbey. Ela perguntou se poderia escrever uma carta para Deus para que, assim que Abbey chegasse ao céu, Deus a reconhecesse. Eu concordei, e ela ditou as seguintes palavras:

Querido Deus,
O Senhor poderia tomar conta da minha cadela? Ela morreu ontem e está ai no céu com o Senhor. Estou com muitas saudades dela. Fico feliz porque o Senhor deixou ela comigo mesmo que ela tenha ficado doente. Espero que o Senhor brinque com ela. Ela gosta de nadar e de jogar bola. Estou mandando uma foto dela para que assim que a veja, o Senhor saberá logo que é a minha cadela.
Eu sinto muita saudade dela.
Meredith

Pusemos num envelope a carta com uma foto de Abbey com Meredith e a endereçamos: Deus - Endereço: Céu. Também pusemos nosso endereço como remetente. Então Meredith colou um monte de selos na frente do envelope, pois ela disse que precisaria de muitos selos para a carta chegar até o céu. Naquela tarde ela colocou a carta numa caixa do correio. Dias depois ela perguntou se Deus já tinha recebido a carta. Respondi que achava que sim.

Ontem havia um pacote embalado num papel dourado na varanda de nossa casa, endereçado a Meredith numa caligrafia desconhecida. Dentro havia um livro escrito por Mr. Rogers, intitulado "Quando um animal de estimação morre". Colada na capa interna do livro estava a carta de Meredith. Na outra página, estava a foto das duas com o seguinte bilhete:

Querida Meredith,
A Abbey chegou bem ao céu. A foto ajudou muito e eu a reconheci imediatamente.
Abbey não está mais doente. O espírito dela está aqui comigo assim como está no seu coração. Ela adorou ter sido seu animal de estimação. Como não precisamos de nossos corpos no céu, não tenho bolso para guardar a sua foto. Assim, a estou devolvendo dentro do livro para você guardar como uma lembrança da Abbey. Obrigado por sua linda carta e agradeça a sua mãe por tê-la ajudado a escrevê-la e a enviá-la pra mim. Que mãe maravilhosa você tem! Eu a escolhi especialmente pra você. Eu envio minhas bençãos todos os dias e lembro que amo muito vocês. A propósito, sou fácil de encontrar: estou em todos os lugares onde exista amor.
Com amor,
Deus
"




Eu nunca precisei tanto escrever na vida como tenho precisado nesses dois últimos meses. Acontece que meus sentimentos simplesmente se entranharam na minha carne e se negaram a sair por um tempo muito, muito longo. Então hoje a Bruna, uma grande amiga e irmã, me passou esse texto – o qual eu realmente não tenho nada para provar que é uma história real além dessa foto, que eu realmente torço que seja da Meredith e da cadelinha Abbey.

Mas a verdade mesmo é que eu pensei que, meu Deus, se uma garotinha de quatro anos é capaz de encarar a morte da sua cachorrinha dessa forma, e consegue expressar seus sentimentos em uma carta simples e cheia de significado, por que eu não consigo falar sobre isso? Por que essa dor ainda me machuca tanto?

Sabe, eu pensava muito no que eu faria quando você morresse. Eu chorava de pensar na possibilidade, porque pra mim você sempre foi uma das coisas mais preciosas da minha vida, Deus sabe. Você tinha onze anos e uma saúde perfeita, por que daquele jeito? As vezes eu acho que a vida fez um plano para acabar com as únicas coisas boas que eu tenho, e você era uma delas. Talvez essas coisas boas fossem principalmente o fato de eu ter você ao meu lado, mesmo quando eu ficava sozinha de tarde em casa e chorava porque não agüentava a solidão. Você nunca me abandonou.

Uma semana antes de tudo acontecer parecia que eu sabia. Parecia que eu sentia. Uma semana antes eu estava falando sobre como eu tinha medo que você ficasse doente e morresse devido à sua idade e à sua visão que já não estava das melhores. Mas você era saudável. Deus, você era saudável!

Me diz, por que eu tive aquela idéia. Eu só queria que você ficasse feliz, entende? Eu só queria chegar em casa e colocar seu potinho de água aqui embaixo porque você passeou demais e ficou cansada. Não era pra ser como foi. Eu queria ter pego você no colo, como eu fazia sempre, e ter tido aquele cuidado especial de duas semanas antes ao acontecido. A culpa é minha, Cindy, me desculpa.

Da série das coisas que eu nunca vou esquecer, o último batimento do seu coraçãozinho nos meus braços ficará em primeiro lugar.

Sabe, às vezes eu acho que ouço seus passinhos pelo corredor, de noite. Por um milésimo de segundo eu espero que você coloque a cabeça pra dentro do meu quarto só pra ver se eu estou bem, e então caminhe até mim porque está com fome e quer companhia até a cozinha. Eu nunca reparei como essas coisas pequenas fazem tanta falta, porque eu ainda espero. Eu ainda espero você nos meus pés de manhã. Eu ainda espero acordar e ver você correndo até mim balançando seu rabinho. Eu ainda espero que você corra atrás do Athos pra que ele vá pro jardim sem fazer paradas por aí, ainda espero o eu latido se juntando aos outros dois. Às vezes eu até acho que estou ouvindo você latir.

Tenho acordado durante a noite com a sensação de que você está nos meus pés. Cindy, será que você ainda está aqui comigo? Porque é tão real.

Parece que eu estou dormindo. Eu sinto que estou meio vegetando em quase noventa por cento do tempo. Quase nada mais me prende a coisa alguma, e eu me sinto cair cada vez que dou um passo pra frente. Eu só queria que isso acabasse, que eu acordasse e descobrisse que nada disso aconteceu e que você está aqui ainda. Eu só queria parar de me culpar.

Tenho muitas dúvidas sobre a existência de um Deus ou de uma energia poderosa que queira me ver bem, porque simplesmente não tem feito sentido. Eu queria ter minha fé renovada, e queria a certeza da Meredith. Queria ter certeza de que você não está sozinha, Cindy, porque eu estou. E eu sei que eu vou acabar suportando isso, mas sei que você não suportava. Quero acreditar que você ainda existe em algum lugar e que está sendo bem tratada. E que não tem sofrido a falta que eu sofro.

Então vamos lá, eu vou tentar. Espero que isso me traga algum conforto e que Steve Jobs já tenha feito um sistema eletrônico genial no céu.

Deus.
Você sabe quem eu sou, creio que tenho lhe dado muitos problemas esses últimos meses aí no céu. Sabe que eu estou com a fé abalada, e sabe que nesse momento meu pensamento é ‘estou escrevendo para um documento do Word e esperando resposta, grande Stephanie’. Mas mesmo assim eu estou escrevendo, não estou? Acho que sobrou um tantinho de fé em algum lugar de mim e estou fazendo um esforço tremendo pra conseguir utilizá-lo sem me sentir uma completa babaca.

Me desculpe. Devo desculpas à muita gente ultimamente, mas talvez o Senhor tenha sido o mais atingido. Toda aquela fé gigante que eu tinha e que parecia me dar respostas tão boas acabou se esvaindo junto com essa porção de coisas dos três últimos anos, e o Senhor sabe bem do que eu estou falando. Todas aquelas coisas pelas quais eu me culpo, e que tiram o meu sono todas as noites. Eu só queria encontrar um pouco de paz de espírito, sabe?

O caso é: não estou suportando toda essa dor. Eu não agüento mais segurar minhas lágrimas com risadas, parece que nem mais meu sorriso é tão sincero quanto era. Eu sinto falta de ser feliz, embora eu ache que nunca consegui chegar aos 85% de felicidade que eu gostaria. Mas aquele pouco que eu era estava bom, e nem isso eu tenho conseguido mais.

Dia 16 fez dois meses que a Cindy morreu, e essa dor ainda não passou. Eu só queria uma certeza de que ela está bem, de que não está sozinha. E, Deus, você sabe que eu estou usando todas as minhas forças pra falar Contigo. Você sabe o quão abalada minha fé está, então espero que esse tantinho de força de vontade signifique alguma coisa. O Senhor sabe o quanto eu amava essa cachorrinha. Você sabe o quão difícil tem sido pra mim passar por tudo isso. Só queria algumas respostas. Não preciso falar tudo o que se passa pela minha cabeça, porque tenho certeza que o Senhor sabe, então tudo o que eu vou perguntar se resume a “Por quê?”.

Por que, meu Deus, por quê? O que tanto eu preciso provar pra mim mesma, ou pro mundo?

Por favor, me dá a certeza de que a Cindy está bem. Me deixa ter uma despedida melhor do que ela nos meus braços olhando pra mim e eu pedindo que ela não morresse. Só quero a certeza de que ela sabe que eu dei o meu melhor, e de que ela não está sozinha.

Eu a amei, Deus. Você sabe o quanto. Você deve saber todos os meus medos, sabe que esse era um dos maiores. Se ela estiver com o Senhor, diga a ela o quanto eu a amo. Fale nas palavras que eu utilizava. Por favor.

Stephanie.


"Cindy, meu amor por você é maior que o universo."

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

forever young, I want to be forever young.

“Você sabe, é difícil ser gente grande” Eu dizia, sentada na cadeira de balanço, balançando com as pernas para frente e para trás. “A gente tem uma porção de obrigações.Contas pra pagar e coisas pra fazer. E não é tão simples quanto ir pra escola e tirar boas notas; não, ser gente grande faz a gente ter que trabalhar. E no trabalho a gente não pode falar alto com o chefe, porque quem recebe a gente quando isso acontece é a rua, não a sala da diretora chata.” 


Coloquei a mão no queixo, pensativa. Bufei um pouco, tirando uma mecha de cabelo que caiu no meu olho, tentando lembrar do que mais a mamãe tinha falado. 


“E quando a gente tem filho, tem mais a obrigação de cuidar do filho, porque o filho precisa da gente. E tem os bichinhos de estimação, que precisam tanto da gente quanto o filho. E filho e bicho de estimação fazem a gente gastar dinheiro, então a gente precisa mesmo trabalhar.” 


Agora eu puxei minhas pernas para cima da cadeira e estou me balançando com as costas. Ele não me responde, mas eu sei que está me olhando com aquela atenção que só ele sabe me dar. 


“Eu não sei o que é obrigação, mas a mamãe fala tanto disso que deve ser mais uma daquelas coisas chatas de gente grande. E tem também o coração. Dizem que quando a gente cresce, às vezes o coração dói. E vivem falando de coração partido na televisão e naqueles textos bonitos que eu leio quando a vovó deixa aqueles livros velhos em cima da cama de manhã. Eu não sei, mas o coração partir deve doer bastante, né? O meu nunca partiu, e eu decidi que nunca vai partir porque não gosto de sentir dor. E nem vou deixar o seu partir, apesar de não saber como um coração parte. Já perguntei como isso acontece. Vovó disse que eu vou descobrir quando virar gente grande.” 


Coloquei as pernas para fora da cadeira e sentei sobre minhas mãos. 


“Sabe, dá um pouco de medo isso. Imagina só, você está andando na rua e PUF! o seu coração se parte. Vovó riu quando eu contei isso pra ela. Não sei como ela pode rir de uma coisa assim, é horrível. Aí ela fez carinho na minha cabeça e foi fazer café. Aliás, café é outra coisa que gente grande gosta muito.” Levantei e fui até o berço, ficando na ponta dos pés e tentando enxergar os olhinhos do meu irmão, que ria e esticava os braços para mim. “Depois ela me disse que às vezes o coração parte porque a gente gosta muito de alguém, mas eu não acreditei porque eu gosto de uma porção de gente e meu coração parece inteiro. O seu também, né?” Perguntei, segurando a mãozinha do meu irmão enquanto ele balançava as perninhas e sorria aquele sorriso desdentado de neném. 


“Eu acho que é difícil ser gente grande. Às vezes eu vejo a mamãe chorando escondida. Ela não sabe que eu sei, então é melhor você não contar que eu te disse isso. Mas ela chora. E a vovó também chora. Elas não querem que a gente veja, porque a gente é pequeno e elas tem que parecer mais fortes que a gente. Mas eu sei que elas não são. Elas são fracas e às vezes parecem tão sozinhas, mesmo que a gente esteja com elas. Pelo menos a gente nunca vai ser sozinho, eu e você, né?” suspirei. Pensar como gente grande exigia muito mais do que minha cabecinha de oito anos conseguia suportar. “Eu não quero ser gente grande. Quero ser pequena pra sempre, eu e você.” Cruzei os braços na grade e apoiei minha cabeça neles, com um pouco de dificuldade por causa da altura. “Mas a mamãe disse que essa é a era da tecnologia. Eu não sei o que é essa tal de tecnologia, mas ela disse que isso vai ajudar muita gente a ficar mais inteligente e que todo mundo vai saber de tudo. Quem sabe eu não descubro como faz pra ser criança pra sempre?” Ele balançou os bracinhos pra mim, e pegou meu dedo. 


“Eu queria ser criança pra sempre. Coração de criança não parte, e a gente nunca se sente sozinho. E você, quer ser criança pra sempre?” Uma risada gostosa de neném, e eu sorri de volta. Então a mamãe chamou pra jantar. “A mamãe tá me chamando, mas eu já volto pra ficar com você, porque eu prometi que você nunca vai ficar sozinho. Eu também não vou deixar seu coração partir, tá bom? A gente vai ser criança pra sempre, como Peter Pan e Sininho. Você vai ver.”


Dei um beijinho desajeitado em sua mãozinha, a única parte do corpo dele que eu conseguiria alcançar, e corri para a sala. Quando voltei ele já estava dormindo, então eu não tinha mais ninguém para conversar sobre meus planos, mas decidi começar a colocá-los em prática. Joguei meu Lego no chão e acabei dormindo entre as peças. Eu estava decidida a não deixar nossos corações partirem.